O meu caderno de desabafos. O meu diário. O meu espaço de catarse; de psicanálise. O meu livro de reclamações. A minha janela para o mundo. Eu. O meu blog. As minhas excitações. As minhas frustrações. As minhas paixões. A vida. A minha, de quem me rodeia, a que eu vejo e sinto. Dentro da lâmpada. Dentro do Mundo.

terça-feira, maio 30, 2006


Uma fábula a propósito…

Reconheço a minha falta de jeito para construir fábulas; não me surgiu, contudo, melhor forma para falar da falta de afirmação, ausência de iniciativa e muito comodismo, quantas vezes também gerado pela ausência de amor e vontade própria.

«Era uma vez uma pequenina flor que teimava em despontar para além da erva alta que a rodeava. Ela tinha uma vontade imensa e descobriu em si um vigor que desconhecia possuir, mas que a fez crescer forte, segura e resistente ao vento. Por causa disso, por ter feito das suas fraquezas força, ganhou um imenso orgulho em si, na sua capacidade e tenacidade, ensinando e incentivando todas as que a rodeavam para que teimassem em descobrir em si o ânimo que as tornaria robustas e faria daquele campo um bonito e invejado tapete de flores multicolores. Não era a mais bonita de entre todas as flores, mas, pela energia que dela transbordava, quase todas as outras a apreciavam, mesmo não sendo ela, nem a mais colorida, nem a mais vistosa, nem a que emanava o perfume mais requintado.

Era uma vez uma planta que cresceu protegida e objecto de todos os cuidados. Era alvo constante do seu criador, que a aparava quando queria crescer demasiado para além daquilo que o seu protector concebera. Ele protegia-a, zelava para que não tivesse nem sol nem humidade a mais, para que os seus ramos não escapassem livremente e desfeassem a obra que zelosamente acarinhava e que, além do prazer de a contemplar e exibir, era a companhia permanente dos seus dias. Ela, delicada planta, gostava e desfrutava por ser o brilho de todas as atenções, mas, um dia, teimosa que era, conseguiu ludibriar atenções e, num esforço corajoso, tentou fazer-se árvore por vontade própria. Descobriu, então, o quanto era frágil e carente, o quanto, por ter crescido enlevada em protecções, desconhecia o mundo e o quanto não estava ajeitada para o enfrentar. Definhou lamentando o gesto de rebeldia que a privou dos cuidados e dedicação, carinhos que a afastaram do seu curso natural e lhe condicionaram o crescimento, mas que a reconfortavam; deplorou os dias e a vida, pobre e desadaptado bonsai que culpava agora o mundo cruel das suas amarguras e angústias, porque cresceu sem defesas, sem forças, sem atitude e com uma desajustada vontade própria que agora o fazia suspirar pela atenção do seu criador.

E era uma vez um pequeno passarinho que hesitava em abandonar o ninho. Tal como o bonsai, ele cresceu objecto, mais do que carinhos, da presença castradora de uma mãe que confundia afecto com a posse egoísta da sua vontade. Ele sabia o quanto desgostaria a sua progenitora quando um dia resolvesse voar para longe, via-o na mágoa que ela fazia questão de demonstrar sempre que ele se aventurava por qualquer ramo vizinho. Não desdenhava os perigos que o espreitavam no seu voo; mas sabia também que, se não encontrasse vontade de ser livre e de encontrar o seu rumo, impediria a sua mãe de gerar novos ninhos.»

Os mais pessimistas dirão que a bota do caçador esmagou a flor antes do tiro certeiro. Os mais optimistas, que uma abelha poisou na flor que se destacava e, nas suas patas, transportou o polén que gerou um mel revigorante, enquanto o pequeno passarinho se fez adulto e soube sempre ensinar as suas crias a voar.
De qualquer modo, do retorcido bonsai, não reza a história. Ainda que a Natureza seja indiscutivelmente menos complexa do que a alma humana!

1 comentário:

Anónimo disse...

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